Mercado da energia em Portugal

Rendas e lucros excessivos<br>à custa do País

Eugénio Rosa

A política (ódio?) de classe do Governo PSD/CDS e da troika contra trabalhadores e pensionistas, traduzido em cortes brutais nos salários e pensões, e num enorme aumento de impostos (apenas o IRS, pois a taxa de IRC até foi reduzida pelo Governo) que atingem principalmente os rendimentos do trabalho e pensões, assim como nas suas manobras dilatórias para adiar a reposição de cortes declarados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, contrasta com a sua passividade e mesmo servilismo quando se trata em tocar nos interesses dos grandes grupos económicos que dominam a economia e a sociedade portuguesa.

Portugal é um dos países da União Europeia onde o preço da electricidade e do gás natural é mais elevado para as famílias

Segundo a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), o mercado liberalizado da eletricidade em Portugal contava, em Abril de 2014, já com 2,7 milhões de consumidores, representando cerca de 77,2% do consumo, e era controlado por seis grandes grupos económicos, dois com nomes portugueses (EDP e GALP) e quatro espanhóis, sendo o grupo dominante a EDP, como mostra o gráfico 1 retirado do «Resumo Informativo do Mercado Liberalizado de eletricidade», uma publicação da ERSE, referente a Abril de 2014.

Como consta do próprio boletim informativo da ERSE, «Em Abril de 2014, a EDP Comercial manteve a sua posição como principal operador no mercado livre em número de clientes (cerca de 86% do total de clientes) e em consumos (cerca de 46% dos fornecimentos do Mercado liberalizado)», seguindo-se os grupos espanhóis Endesa e Iberdrola, quotas estas que não se têm mantido inalteráveis ao longo dos anos (por ex., em 2010, como consta do nosso livro «Grupos económicos e desenvolvimento em Portugal no contexto da globalização», a EDP tinha uma quota de 50% no mercado liberalizado da eletricidade). Para além disso a EDP tem o controlo total (100%) do mercado regulado de electricidade através da EDP – Serviço Universal, ou seja, dos restantes consumidores.

Em relação ao mercado do gás natural em Portugal, ele é também controlado por alguns grupos que dominam o da electricidade, como mostra o gráfico 2, divulgado no «Resumo Informativo do Mercado Liberalizado do gás» da ERSE, referente ao 1.º trimestre de 2014, revela.

O mercado de gás natural em Portugal é dominado pela GALP que, em Março de 2014, detinha 65% do mercado, seguido do grupo espanhol GNF (Gás Natural Fenosa) com uma quota de 17% e da EDP com uma quota de cerca de 10%.

Quem controla os grupos
que dominam o mercado

 Vamos apenas analisar a estrutura acionista da EDP e da GALP, dois grupos que ainda têm nomes portugueses, e que por isso podem enganar muita gente, pois os restantes são meras filiais de grupos estrangeiros. O quadro 1 permite essa análise.

As participações qualificadas são aquelas que representam pelo menos 2% do capital e são as que controlam, de facto, tanto a gestão estratégica como operacional da empresa.

E como mostram os dados do quadro 1, 83,76% das participações qualificadas da EDP e 54,46% das participações qualificadas da GALP, portanto muito mais de metade, já são controladas por grandes grupos económicos estrangeiros, vários deles empresas de estados estrangeiros (China, Abu Dahi, Argélia, e Qatar). Mesmo a Amorim Energia é uma empresa com sede na Holanda portanto já não está sob alçada de tribunais

portugueses nem da Administração Fiscal portuguesa, e quase metade dela é angolana.

Por esta razão, pode-se com verdade dizer que a EDP e a GALP são empresas mais estrangeiras que portuguesas – de português têm apenas os nomes e os clientes e trabalhadores que exploram – pois as suas estratégias e objetivos têm menos a ver com Portugal e muito mais com os objetivos e estratégias dos grupos que as controlam.

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Preços em Portugal
superiores à média da UE

Os dois gráficos com os preços da eletricidade e do gás natural para as famílias nos países da União Europeia, em 2013, mostram que apesar dos salários em Portugal serem dos mais baixos da UE (nos últimos 3 anos perderam cerca de 10% do seu poder de compra), Portugal é um dos países da União Europeia onde o preço da electricidade e do gás natural é mais elevado para as famílias.

Como mostra o gráfico 3, divulgado pelo Eurostat, Portugal é o 7.º país da União Europeia, entre os 28 países que a constituem, onde o preço da eletricidade para as famílias é mais elevado, sendo também o preço da eletricidade em Portugal superior ao preço médio da UE (veja-se, no gráfico 3, as colunas indicadas com setas que correspondem ao preço da eletricidade em Portugal e ao preço médio da UE28).

Situação ainda mais grave se verifica em relação ao preço do gás natural para as famílias. Como mostra o gráfico 4, também divulgado pelo Eurostat, Portugal é o 4.º país, entre os 28 países que constituem a União Europeia, em que o preço do gás natural é mais elevado para as famílias, sendo também o preço do gás no nosso País significativamente superior ao preço médio praticado na União Europeia (veja-se também o gráfico 4, onde as colunas indicadas com setas correspondem ao preço do gás natural em Portugal e ao preço médio na UE28).

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Preços excessivos geram
rendas e lucros excessivos

Preços excessivos e muito superiores aos que vigoram na maior parte dos países da União Europeia pagos pelas famílias portuguesas geram rendas excessivas e lucros elevados de que se apropriam os grupos económicos, controlados por estrangeiros, que dominam os mercados da eletricidade e do gás natural em Portugal. E tudo isto perante a passividade do Governo e da entidade reguladora (ERSE), pois estão totalmente reféns desses grupos económicos. O quadro 2 mostra os lucros líquidos acumulados pelos dois

grupos económicos, controlados por estrangeiros, que dominam o mercado da energia (a EDP e a GALP) de acordo com os Relatórios e Contas que divulgaram, em plena crise e de graves dificuldades para as famílias portuguesas.

Entre 2008 e o 1.º trimestre de 2014, a soma dos lucros líquidos da EDP atingiu 6897 milhões de euros, e os lucros líquidos da GALP somaram 2103 milhões de euros. Portanto, só estes dois grupos económicos (pois existem mais, que são filiais de grupos estrangeiros, que detêm quotas de mercado mais reduzidas) tiveram, em conjunto, 9000 milhões de lucros líquidos. Pode-se dizer que a crise não atingiu os grupos económicos que dominam o mercado da energia em Portugal. E isto à custa das famílias portuguesas e também da

competitividade das empresas portuguesas, que tiveram de suportar custos excessivos para alimentar os elevados lucros dos grupos económicos da energia.

Este Governo e esta troika que têm uma política de dois pesos e duas medidas (proteção dos interesses e dos lucros escandalosos dos grupos económicos e cortes brutais nos rendimentos dos trabalhadores e pensionistas) não tem qualquer moral para impor sacrifícios aos portugueses, até porque têm utilizado como justificação um objetivo que nunca cumpriram (contenção da dívida pública), pois desde que entraram em funções (Governo e troika) a dívida pública portuguesa disparou aumentando, entre Dez.2010 e Março de 2014, de 185 844 milhões de euros (107,5% do PIB) para 258 486 milhões de euros (155% do PIB), segundo o Boletim de Estatística do Banco de Portugal de Maio de 2014 (entre Dez.2013 e Mar.2014 a dívida subiu de 252 914 milhões de euros para 258 486 milhões de euros, o que mostra que mesmo este ano ela não parou de crescer sendo já incomportável para o País e para os portugueses). A troika, ao falar tanto dos custos excessivos da energia em Portugal os quais, segundo ela própria, reduz a competitividade das empresas, e a nada fazer de concreto para alterar esta situação, mostra bem que ela veio a Portugal apenas para defender os interesses dos «credores» e dos grupos económicos que dominam a economia e a sociedade, revelando também assim a sua verdadeira face de classe.